UE pega leve com Apple e Meta, para não irritar Trump

A União Europeia (UE) se prepara para aplicar as multas prometidas contra Apple e Meta, por estas violarem a Lei de Mercados Digitais (DMA) e não reverem suas práticas. No entanto, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ameaçou mais de uma vez a Comissão Europeia de retaliação, na forma de tarifas pesadas sobre produtos de exportação.

  • UE: Apple “se adequa” à DMA… criando novas taxas
  • UE: Meta violou DMA ao cobrar para não coletar dados

Agora, segundo fontes próximas, membros da Comissão estariam dispostos a “pegar leve” nas multas, que originalmente alcançariam dezenas de bilhões de dólares, para não irritar Trump e evitar uma escalada ainda maior das tensões.

Apple deve ser multada por dificultar compras por fora da App Store, e Meta, por cobrar para não coletar dados (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Apple deve ser multada por dificultar compras por fora da App Store, e Meta, por cobrar para não coletar dados (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Apple e Meta tentaram enrolar a UE

Vamos recapitular: a DMA, a lei antitruste, dita as regras para como as grandes companhias de tecnologia, em especial as não-europeias, podem operar nos 27 países-membros da UE. Ela restringe operações e práticas anticompetitivas, como proibir que empresas privilegiem seus próprios produtos e serviços, mesmo em seu próprio hardware ou plataformas.

Esta regra afeta diretamente a Apple, pois ela fica impedida, conforme a Lei, de obrigar desenvolvedores a distribuírem seus apps e games voltados para iPhone e iPad apenas por sua App Store, bem como não pode impedir que estes usem métodos de cobrança alternativos, que não rendem comissões à maçã, e liberar a entrada de lojas alternativas, como a Epic Games Store.

Vale lembrar que tudo o que se aplica à Apple vale também para o Google no que tange ao Android, mas nos foquemos em Cupertino aqui.

A companhia de Tim Cook é absolutamente contra o sideloading, e sequer cogita a ideia de deixar de tirar sua parte da receita de apps, quer eles usem o caixa da App Store ou não. Originalmente, a Apple estabeleceu regras que estipulavam um pagamento de 12% ou 27% para quem usasse cobranças alternativas, respectivamente de devs inscritos no programa de pequenas empresas, e os demais.

Como o sideloading, a Apple foi ainda mais draconiana, ao estabelecer comissões de 10% e 17%, mais uma taxa adicional de 3% sobre o processamento de compras. Fora isso, apps e games que ultrapassem a marca de 1 milhão de downloads totais (updates via OTA também contam) pagam outra comissão, de 0,50 € (~R$ 3,08, cotação de 01/04/2025) por instalação, todos os anos.

Em todos os casos, a maçã exige a submissão de relatórios de operações financeiras, para que ela mesma audite as informações e calcule o valor a ser cobrado. Do contrário, ela não permite nenhuma das práticas.

A UE não deu moleza para Tim Cook, CEO da Apple (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

A UE não deu moleza para Tim Cook, CEO da Apple (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

A UE obviamente não gostou, e mandou a Apple revisar o plano, no entendimento dos legisladores, a maçã não tem que cobrar nada. Esta estabeleceu um novo plano, supostamente mais simplificado, mas criou outras duas taxas, que complicaram ainda mais o procedimento, de modo que os devs achariam ser mais fácil não sair do cercado da App Store, a real intenção da gigante de Palo Alto.

Como consequência, a UE determinou que a Apple violou a DMA e não tinha nenhuma intenção de se adequar à lei, prometendo aplicar a multa padrão de 10% do faturamento global anual, o que com base no período de 2024, se reverteria em US$ 39,1 bilhões (~R$ 223,58 bilhões), podendo dobrar em caso de reincidência.

O Meta, por sua vez, se enrolou com o plano “consent or pay” (consinta, ou pague), desenvolvido para contornar a regra da DMA que obriga as empresas de serviços digitais a permitir que seus usuários optem por uma experiência sem anúncios, e a oferecer total controle de seus dados, ou seja, eles podem decidir se querem ou não que o Facebook, WhatsApp, Instagram, Facebook Messenger coletem, ou não, suas informações. E a maioria não quer.

O “consent or pay” seriam planos de acesso ao Facebook e Instagram exclusivos da UE, para a navegação sem anúncios direcionados, que implicam em coleta de dados, mediante um pagamento mensal de 13 € (~80,16); quem não quiser pagar estará sujeito à coleta, ou seja: com grana ou com dados, o usuário VAI pagar, de qualquer jeito.

A companhia chegou a propor um corte de 50% na taxa, mas a Comissão Europeia entendeu que a prática, chamada informalmente de “tática binária”, não era diferente da velha abordagem da Máfia italiana de venda de proteção. A Lei era clara, o usuário não tem que pagar nada se não quiser, e assim, o Meta também ficou sujeito à multa de 10% do faturamento global anual, que poderia chegar a US$ 16,4 bilhões (~R$ 93,9 bilhões).

Google e Amazon também estão enrolados com a UE, envolvendo mais algumas dezenas de bilhões de dólares em possíveis multas.

Plano de Mark Zuckerberg, CEO do Meta, para "vender proteção" não colou (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Plano de Mark Zuckerberg, CEO do Meta, para “vender proteção” não colou (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

O problema para a UE, Donald Trump foi reeleito presidente dos EUA, e este não gosta nem um pouco das ameaças de multa às companhias americanas.

Trump: “quem multar, será taxado”

A Comissão Europeia deve aplicar as multas contra Apple e Meta durante a primeira semana de abril de 2025, mas de acordo com fontes próximas, o corpo executivo de Bruxelas não deve seguir a DMA literalmente, ao invés disso, deverá impor pagamentos “mínimos”, que seriam mais como advertências, além de recomendações para que ambas companhias adequem seus métodos à Lei local.

A intenção é clara, a UE não quer escalar a guerra comercial com Donald Trump, que já anda acirrada; este prometeu responder às prometidas multas, sejam elas pesadas ou leves, com novas tarifas contra quem quer que ouse prejudicar os negócios das gigantes do Vale do Silício. O problema, o recado do presidente dos EUA é claro: quem multar, não importa o valor, sofrerá com novas taxas.

No entendimento da Casa Branca, Apple, Meta, OpenAI e cia. devem ser livres para conduzirem seus negócios como quiserem, em qualquer lugar do mundo, sem serem limitadas por nenhuma lei ou regulação. Esta seria uma versão 2025 da “diplomacia do porrete”, onde os EUA mandam, e o mundo obedece; a França, por exemplo, multou a Apple em US$ 162 milhões, e pode sofrer retaliações comerciais em breve.

Claro, não para aí. Trump estabeleceu o dia 2 de abril de 2025 como o “Dia da Liberação”, em que as prometidas taxas contra México, Canadá e China entrarão em vigor, além das ditas “tarifas universais”, uma cobrança recíproca em respostas às taxações que os demais países aplicam em produtos americanos. Estas são cobranças inevitáveis e afetarão o mundo inteiro, sem exceções.

Trump prometeu aplicar tarifas recíprocas a todos os países, o que sairá caro para a UE (Crédito: Chet Strange/Getty Images)

Trump prometeu aplicar tarifas recíprocas a todos os países, o que sairá caro para a UE (Crédito: Chet Strange/Getty Images)

Trump justifica a ameaça de responder às multas aplicadas contra companhias americanas de tecnologia pela UE, como uma ação contra “ações que inibem o crescimento” das big techs; as regras da DMA buscam nivelar as condições e tornar a Europa mais competitiva, principalmente para as empresas locais, mas o presidente dos EUA entende a regulação como um ataque ao Make America Great Again, onde os EUA devem deter a soberania tecnológica global, e o resto do mundo tendo que consumir seus produtos e serviços.

A situação deve se desdobrar em novos desenvolvimentos tão logo a UE anuncie as multas, se elas vierem mesmo a serem implementadas, já que para alguns críticos, a ação amenizada para não irritar Trump foi entendida como um ato de covardia, e não duvidam que ela se resuma a um tapinha nas mãos de Apple e Meta, e um sermão de leve para não voltarem a aprontar.

Fonte: Ars Technica

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