Adequação redacional normativa

Recente alteração no código de processo civil brasileiro, advinda da Lei nº 14.939/2024, sob o ponto de vista de semântica, de gramática e, por conseguinte, de linguagem, comporta considerações. Assim se encontra redigida a nova regra: “O recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso, e, se não o fizer, o tribunal determinará a correção do vício formal, ou poderá desconsiderá-lo caso a informação já conste do processo eletrônico.” Abstraindo-se da análise o tempo verbal – se presente ou futuro – percebem-se, realmente, defeitos no texto.
É que o recorrente poderá ter o interesse, ou a estratégia processual, em não comprovar. Ou, ainda, poderá estar impossibilitado para tal missão, por um motivo qualquer. Desse modo, sob o aspecto semântico, para a primeira parte do comando legal, melhor seria: Cabe ao recorrente comprovar – e ele avalia, se faz ou não, inclusive por ser o direito uma ciência deontológica. Noutro passo, a linha sequencial da frase poderia ter sido desenhada doutra forma, em que se tornaria o comando normativo mais linear, mais uniforme e, por continuado, mais simples e direto. Sugestão: Cabe ao recorrente comprovar a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso, competindo ao tribunal, na ausência de comprovação, determinar a demonstração da existência do feriado ou desconsiderar o vício formal, caso a prova conste no processo eletrônico.
A diferença pode ser tênue, mas há, sim, desigualdade entre uma e outra, sendo certo, todavia, ser o texto-sugestivo mais coeso, formatado numa sequência vocabular direta e de mais tranquilo entendimento. Na passagem da regra nova em que consta “e, se não o fizer,”, vê-se, além de eventual cacofonia, trecho que pode trazer o não entendimento para uma pessoa mais simples ou que não lide com a área jurídica, sendo recomendável que se evitem tais construções, sobretudo em textos oriundos do poder público, como é o caso do legislativo.
Além da semântica textual, será sempre bem-vinda, quando o tema é ato redacional, que se adote um fluxo de vocábulos com uma eloquência simples, porém direta, clara, sem rodeios e, máxime, que traga o entendimento uníssono, sem indício de qualquer dúvida, também.
A propósito, ciência deontológica nada mais é senão ramo do conhecimento que indica ideia de postura, de dever, de obrigação, considerando, mesmo, ética ou moral. Redação normativa – e isso vale para produção de escrita em eixo geral – precisa considerar minúcias, sem que isso seja visto como picuinha analítica.
Resta saber, no entanto, para não ficar só na análise da linguística em si, se a tempestividade será considerada caso não seja o tema abordado no próprio apelo, e somente em agravo interno, nas hipóteses de liminar indeferimento, por ausência de demonstração do feriado local e, como dito, inadvertência na não abordagem, na peça – recurso – em que se busca julgamento na instância seguinte.

RODRIGO CAVALCANTE
PROFESSOR UNIVERSITÁRIO E SECRETÁRIO DE AUDITORIA INTERNA NO TRT/7ª REGIÃO

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