A hipocrisia na avaliação de discursos e atitudes na política brasileira

A percepção e a interpretação dos discursos e das atitudes de figuras públicas muitas vezes são determinadas mais por quem as profere do que pelo conteúdo em si. No Brasil, essa realidade tem se mostrado de maneira evidente, especialmente nos últimos anos, com a ascensão e a queda de um ex-presidente que deixou um legado marcado pelo desrespeito às instituições democráticas, às minorias e ao próprio povo brasileiro.
Se olharmos para algumas das falas e ações deste ex-mandatário, percebemos que, caso tivessem sido ditas ou feitas por um político de esquerda, as reações da sociedade e da mídia seriam drasticamente diferentes. Imaginemos, por exemplo, se um político progressista declarasse que a ditadura deveria ter matado 30 mil brasileiros. Certamente, haveria uma comoção nacional e uma exigência implacável por responsabilização. Contudo, quando essa fala veio do ex-presidente da extrema-direita, seus seguidores minimizaram, relativizaram e até normalizaram o absurdo.
Outro caso emblemático foi o episódio em que o ex-presidente afirmou que não estupraria uma deputada porque ela seria feia. Se um político de esquerda fizesse tal declaração, certamente sua carreira estaria terminada. No entanto, o então presidente não apenas permaneceu impune, como continuou a ser apoiado por setores que, paradoxalmente, se dizem defensores da moral e dos bons costumes.
A hostilidade deste ex-presidente com a imprensa também foi uma constante. Em diversas ocasiões, ele mandou jornalistas calarem a boca ou os atacou verbalmente por perguntas incômodas. Apesar da gravidade dessas atitudes, a imprensa, que deveria repudiar tais ações, frequentemente se mostrou conivente. Caso uma figura de esquerda tivesse feito o mesmo, o discurso hegemônico seria de que a liberdade de imprensa estava sob ataque.
A desumanização também foi uma característica presente em seu discurso. Em um dos momentos mais revoltantes, o ex-presidente comparou quilombolas a animais, referindo-se a seus pesos em arrobas. Declarações como essa, vindas de qualquer outro político, especialmente da esquerda, gerariam um clamor popular e institucional para sua remoção imediata.
Durante a pandemia de COVID-19, a postura negacionista do ex-presidente custou milhares de vidas. Sua rejeição às orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e sua recusa em adquirir vacinas com a devida urgência contribuíram para o colapso do sistema de saúde e o luto de incontáveis famílias. Qual teria sido a reação se um líder de esquerda tivesse adotado a mesma postura? Certamente, teria sido duramente atacado e responsabilizado sem hesitação.
O episódio do 8 de janeiro de 2023, quando grupos extremistas invadiram prédios públicos em um ato violento de afronta à democracia, também escancara a desigualdade de tratamento. Se fosse um grupo de esquerda que tivesse realizado tal ataque, a repressão e as consequências seriam severas e implacáveis. No entanto, com os protagonistas reais desse atentado, houve um nível de condescendência alarmante por parte de certos setores da sociedade.
Atualmente, um dos filhos do ex-presidente, residindo nos EUA, tem atentado contra a soberania nacional ao pedir uma intervenção estrangeira, sob a alegativa de que o Brasil estaria vivendo sob uma ditadura do judiciário. Isso revela não apenas uma postura antidemocrática, mas também um comprometimento com interesses externos que vão contra os princípios da soberania nacional.
O que esses exemplos demonstram é que o julgamento público e midiático é seletivo. A indignação não é pautada pelos fatos em si, mas pela ideologia do autor das ações. Essa hipocrisia prejudica o debate público, fortalece a desinformação e enfraquece nossa democracia. É fundamental que discursos e atitudes sejam avaliados de maneira equânime, independentemente de sua origem política, pois a justiça e a democracia só podem prevalecer quando medidas iguais são aplicadas a todos.
Estes fatos citados acima demonstram claramente o número assustador da população que se revela misógina, racista, homofóbica e sem nenhuma cultura política que se alicerce na verdade…e o pior, tudo em nome de Deus.

EDMAR XIMENES
GEÓLOGO

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