O Max, serviço de streaming da Warner Bros. Discovery, sofreu mais um corte de conteúdo nos Estados Unidos: de forma um tanto chocante, todos os curtas clássicos dos Looney Tunes, com produções abrangendo quatro décadas, foram removidos da plataforma, mas continuam disponíveis em outros países, como o Brasil.
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Esta não é a primeira vez que a Warner, sob o comando de David Zaslav, remove produções do serviço de streaming, mas ao longo dos anos, a companhia deixou clara a intenção de voltar a plataforma a adultos e famílias, ao considerar que crianças não são um público rentável.

Remoção dos Looney Tunes do Max nos EUA é mais um lembrete que nada está seguro sob a gestão atual da Warner (Crédito: Divulgação/Warner Bros.)
Para a Warner, crianças no Max não dão dinheiro
Como dito várias vezes antes, desde que Zaslav assumiu o comando da Warner, ele deixou claro vez após outra que só se importa com dinheiro, mais especificamente, em maximizar os ganhos a todo custo, gastando o mínimo possível, de preferência, nada. Embora seja óbvio que a missão de qualquer empresa é dar lucro, qualquer corpo executivo que se preze entende que é preciso gastar para ganhar mais, ou seja, “quem quer rir, tem que fazer rir”.
Zaslav não pensa assim, salvo casos raros curiosamente focados na franquia Harry Potter, com a liberação de um gordo orçamento para a nova série de TV (US$ 200 milhões por livro/temporada ao longo de uma década, ~R$ 1,14 bilhão, cotação de 18/03/2025), e a produção de uma continuação de Hogwarts Legacy; em comum, os filmes passados e o primeiro game retornaram muita grana aos cofres da Warner, logo, é um caso de exceção que confirma a regra.
Outras obras não tiveram sorte. Batgirl, o filme que seria estrelado por Leslie Grace, e que estava na fase de pós-produção, foi cancelado, incluído na dedução do Imposto de Renda, e deletado, tendo deixado de existir; o mesmo destino foi reservado a Coyote vs. Acme, que estava pronto e chegou a ser exibido em salas de teste, e comparado por quem assistiu a Uma Cilada Para Roger Rabbit.
Em comum, Zaslav considerou que o custo de produção não compensaria o investimento em marketing, e a ordem para filmes passou a ser “go big, or go home“, ou seja, nada de TV, e foco no cinema. Coyote vs. Acme, que custou US$ 70 milhões, chegou a ser negociado com outros estúdios, mas ninguém quis pagar US$ 80 milhões, preço fixado pelo CEO, sem direito a contra-propostas.
Os conteúdos para TV também não escaparam. Paralelo aos vários cortes durante a reestruturação do DCU, sob a liderança de James Gunn e Peter Safran, a Warner tratou também de podar uma série de atrações legadas do Max, outrora HBO Max, que originalmente deveria ser a casa de tudo relativo ao estúdio, porém, um padrão foi notado: os alvos eram preferencialmente produções infanto-juvenis.

Steven Universo, Hora de Aventura, e O Fantástico Mundo de Gumball também foram removidos do Max nos EUA (Crédito: Reprodução/Cartoon Network/Warner Bros.)
A primeira leva de cortes, que ocorreu em 2022, derrubou produções como OK K.O.! Vamos Ser Heróis, Trem Infinito, e Close Enough, junto de outras em live action; todas removidas do streaming e posteriormente dos serviços de venda/aluguel digitais, tornando-se impossíveis de serem adquiridas de forma legal.
Em 2023, foi a vez de séries mais famosas e com apelo junto aos jovens, como O Laboratório de Dexter, Ben 10: Supremacia Alienígena, e A Mansão Foster Para Amigos Imaginários; em 2024, a foice desceu em Hora de Aventura, Steven Universo, Ursos Sem Curso, O Fantástico Mundo de Gumball, o remake de 2016 d’As Meninas Superpoderosas, e Chowder.
Quando os cortes de 2024 foram anunciados, a Warner justificou o movimento como uma reformulação do foco do Max, que estaria sendo voltado para uma programação destinada a “adultos e famílias”, e que conteúdos infantis “não se saem bem”, trocando em miúdos, não valem o investimento. Isso coincide com uma declaração de Zaslav em 2022, sobre voltar a focar em cinema após o fim do lockdown, ao dizer que o então HBO Max era um serviço ruim, e chamou os assinantes eventuais de “clicadores de sites dos anos 1990”, um público que ele não tem interesse em atender, porque “não gastam”.
Com o tempo, ficou clara a intenção da Warner de apostar apenas naquilo que os executivos acreditam que vai retornar muito dinheiro, onde produções menores, em todas as frentes (TV, cinema, HQs, games) foram deixadas de lado. Da mesma forma, Zaslav não considera crianças um público pagante interessante, e usando a mesma desculpa do foco em adultos, a companhia desceu o facão em… Vila Sésamo.
O programa, estrelado por atores e os bonecos desenvolvidos por Jim Henson, é uma instituição infantil no escopo educacional há décadas, e foi exportada e adaptada em todos os cantos do mundo, Brasil incluso. Desde 2016, a produção do show está a cargo da Warner, que o exibiu no canal HBO até 2020; as temporadas de 2021 em diante passaram a ser exclusivas do Max, até que em 2024, foi revelada a decisão de que novos episódios não serão produzidos.
O contrato vigente expira em 2027, e até lá, o Max manterá os episódios de todas as 55 temporadas produzidas no Max, mas depois disso, sabe-se lá. Basicamente, Garibaldo teve que colocar uma placa de “Vende-se” na entrada da vila, e muitos especulam que a Apple, que já detém os direitos das criações de Charles Schulz para a TV (Peanuts/Minduim/Charlie Brown & Snoopy), seja a primeira da fila para comprar.

Nem Vila Sésamo, uma instituição infantil há décadas, escapou (Crédito: Divulgação/Sesame Workshop/Warner Bros.)
Agora, a Warner foi além e removeu nos EUA todos os episódios clássicos dos Looney Tunes, os desenhos originais estrelados por Pernalonga e cia., produzidos por gente do calibre de Chuck Jones, entre 1930 e 1969. A plataforma ainda mantém desenhos mais recentes dos personagens, mas está bem claro que, se mesmo produções que são consideradas o cartão de visitas da Warner estão seguras, nada está.
Vale lembrar que, exceto o fim da produção de novos episódios de Vila Sésamo, os cortes do Max afetam principalmente os Estados Unidos. Nem todas essas produções estavam disponíveis aqui na plataforma da Warner (Chowder, por exemplo, foi para o Prime Video), e somente algumas também não estão mais disponíveis no Brasil, como as da primeira onda de remoções, que incluem Trem Infinito e OK K.O.! Vamos Ser Heróis, entre outras.
Embora a administração atual use a desculpa de mudança de foco, há outros fatores envolvidos na remoção de conteúdos de plataformas de streaming, e isso não se restringe ao Max. Filmes, séries e documentários, ovos ou legados, rendem valores residuais de royalties a serem pagos a atores, dubladores, diretores, produtores, roteiristas, pelo tempo em que permanecerem no ar.
Tire-os do serviço e também da venda digital, e Warner, Disney, Universal, Netflix, Amazon, etc. não precisam pagar mais nada a ninguém, principalmente se não houver disponibilidade desses conteúdos em mídia física; você pode comprar Blu-rays dos Looney Tunes, por exemplo, mas a série baseada em Willow, produzida pela Lucasfilm para o Disney+, só existia no meio digital e após removida, não mais pode ser acessada pelos meios legais.
Ou seja…

É isto o que vai acontecer (Crédito: Reprodução/South Park Studios/Comedy Partners/Paramount)
Quando o streaming se popularizou graças à Netflix, muitos deixaram de frequentar a baía de tortuga, fazendo valer o argumento de Gabe Newell, presidente da Valve, de que a pirataria se combate com bons serviços e preços justos. No entanto, a sanha dos estúdios por dinheiro e controle levou à balcanização do setor, com cada um lançando a sua plataforma, cada uma com uma mensalidade, ao invés de pagar direitos em prol de um guarda-chuva comum.
Como resultado, muitos voltaram ao torrent e outras formas ilegais de consumo de conteúdo, como o Stremio, um streaming baseado em P2P e com suporte a legendas bastante popular, tanto que possui apps compatíveis com Smart TVs que rodam sistemas não-Android, como Tizen (Samsung) e webOS (LG).
A verdade é que o público quer consumir conteúdo, e se o streaming não o oferece, o usuário dará o seu jeito, e nem sempre será abrindo a carteira.
Fonte: Deadline
Max não é lugar para crianças, segundo a Warner