Justiça condena criminalista a pagar R$ 50 mil de indenização a Alexandre de Moraes por chamá-lo de advogado do PCC em júri em SP


Ministro do STF foi criticado por advogado Celso Vendramini por prender golpistas em Brasília em 8 de janeiro de 2023. Declarações ocorreram naquele ano, em júri em que defendia PMs acusados de homicídio. Moraes nega ter defendido facção. Advogado pode recorrer. Ministro do STF entra com ação contra criminalista que o chamou de advogado de facção
A Justiça de São Paulo condenou o advogado criminalista Celso Vendramini a pagar indenização de R$ 50 mil por danos morais a Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) por tê-lo chamado de “advogado do PCC” durante o júri de dois policiais militares acusados de assassinar dois suspeitos de roubo.
A sentença foi dada em 7 de março deste ano pelo juiz Fauler Felix de Avila, da 39ª Vara Cível. Cabe recurso contra a decisão.
“Configurado o ato ilícito praticado pelo requerido, consistente nas ofensas à honra e à dignidade do autor, bem como o nexo causal entre tal conduta e o abalo moral dela decorrente”, escreveu o magistrado. “O valor pretendido de R$ 50 mil mostra-se adequado e proporcional”.
As declarações de Vendramini ocorreram em 12 de junho de 2023, durante julgamento de dois agentes da Polícia Militar (PM) no Fórum Criminal da Barra Funda, Zona Oeste da capital paulista, e foram gravadas em vídeos e áudios com autorização judicial.
O g1 teve acesso aos áudios nos quais Vendramini, que defendeu os PMs, associou Moraes ao Primeiro Comando da Capital, facção criminosa que atua dentro e fora dos presídios no país (ouça acima).
Moraes não estava participando do júri em São Paulo e nega ter advogado para o PCC (leia mais abaixo). Mesmo assim, o ministro teve o nome citado por Vendramini naquele dia:
Os senhores viram aqui quando eu falei de Alexandre de Moraes, o promotor falou ‘ó, está sendo gravado, hein…’tá querendo me intimidar. Eu não tenho medo não, dele, de ninguém. Me processa, doutor, não me ponha medo, pelo amor de… não tenho medo de ninguém. Que ajudar, doutor. É um indivíduo que tá lá, que foi secretário (inaudível), da PUC de SP, que é advogado do PCC.
“Me processa, doutor”, fala Vendramini ao promotor Leonardo Spina durante a fase de debates. Nessa fase do julgamento, defesa e acusação debatem suas teses para tentar convencer os jurados, que votarão se condenam ou absolvem os réus.
Naquela ocasião, o representante do Ministério Público (MP) acusava dois policiais militares de executarem a tiros dois suspeitos de assalto em 2017. Os rapazes já estavam rendidos e estariam desarmados quando foram abordados, de acordo com a Promotoria.
A defesa dos acusados alegava que seus clientes atiraram nos dois homens porque eles estavam armados e para se defender dos tiros que eles teriam dado antes. Os PMs respondiam ao crime de duplo homicídio em liberdade, mas estavam no plenário. Ao defender a tese de inocência, Vendramini continuou usando Moraes como exemplo:
“O indivíduo que tá lá, que pensa que tá com (inaudível) na PUC de São Paulo, que é advogado do PCC. Tá. E se todo mundo se cala. Se teme pra esse homem. É o Ministério Público, é a magistratura, é a OAB. Ele, quando prendeu em 8 de janeiro aqueles infelizes, não teve audiência de custódia”, diz Vendramini, acusando Moraes. “Não sou bolsonarista. Não tenho nada a ver com Bolsonaro.”
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Vendramini também falou no julgamento que o ministro decretou prisões ilegais de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes no dia 8 de janeiro de 2023 em Brasília.
Essas pessoas foram presas e acusadas de golpe de Estado por não aceitarem o resultado das eleições presidenciais que deram vitória a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre Bolsonaro, em 2022.
O promotor chegou a pedir que as acusações do advogado dos PMs contra Moraes constasse na ata do julgamento. A juíza Paula Marie Konno pediu para Vendramini não ofender mais ninguém. Ele respondeu, porém, que poderia falar o que quisesse para defender seus clientes no plenário. E que teria como provar, por meio de informações que circulam na internet, que o ministro do STF foi advogado do PCC.
Por causa do comportamento do advogado, considerado inapropriado e desrespeitoso, podendo influenciar os jurados, a magistrada anulou o julgamento, que foi remarcado para 2024. No novo julgamento, os dois policiais defendidos por Vendramini foram absolvidos da acusação de homicídios pelos jurados.
As gravações com as falas do advogado também foram encaminhas à época para a Polícia Federal (PF) por envolverem acusações contra um ministro do STF. A PF iria investigar o caso na esfera criminal.
Moraes nega ter advogado para PCC
O ministro do STF, Alexandre de Moraes, em imagem de novembro de 2022
Adriano Machado/Reuters
Essa foi a terceira vez que Moraes moveu uma ação contra quem o chamou de advogado do PCC. Em 2017, quando foi sabatinado no Senado antes de se tornar ministro do STF, ele já havia respondido perguntas dos parlamentares negando ter defendido a facção criminosa.
Moraes nega ter sido advogado de facção criminosa e plagiado obra de espanhol
Ele esclareceu que o escritório de advocacia em que trabalhava em São Paulo atendeu a cooperativa de transportes Transcooper em casos relacionados a acidentes de trânsito causados por motoristas.
“Absolutamente nada ficou comprovado em relação ao deputado, à Transcooper, que emprestou a garagem, muito menos nada em relação ao escritório. Primeiro que [o escritório] não sabia da reunião, segundo nada sabia em relação à garagem”, afirmou Moraes em 2017.
Segundo o ministro, em 2014, durante a campanha eleitoral, um deputado estadual de São Paulo pediu a seu irmão, vereador da capital paulista e cooperado da Transcooper, uma garagem emprestada para uma reunião. Na ocasião, estavam presentes na garagem duas pessoas investigadas por ligação com a facção, disse Moraes.
Ele ainda lembrou decisões judiciais de São Paulo que mandaram retirar notícias “caluniosas e difamatórias” sobre o episódio.
O pedido de indenização contra Vendramini foi por Barci de Moraes, escritório de advocacia da família do ministro.
“É a terceira vez que o requerente é vítima das mesmas imputações! A cada ofensa ao seu direito de personalidade no aspecto honra, as consequências são ainda mais gravosas, pois reforçam uma imaginação pública a seu respeito”, informa trecho do pedido de indenização feito pelos advogados de Moraes sobre a acusação de que advogaria para o PCC.
O g1 não conseguiu localizar o advogado de Moraes, para comentar o assunto até a última atualização desta reportagem.
Vendramini foi procurado pela reportagem e disse que enviaria um posicionamento para comentar a condenação por dano moral e se defender das acusações. Em outras ocasiões, o advogado havia dito que ele tem “a liberdade” de se manifestar como quiser no júri.
Advogado já foi condenado por homofobia
Advogado foi acusado de fazer comentários homofóbicos durante júri
Em julho de 2023, a Justiça havia condenado Vendramini por homofobia contra a promotora Cláudia Ferreira Mac Dowell ao fazer, segundo a acusação, comentários homofóbicos contra ela durante um julgamento ocorrido em 2019. Naquela ocasião, o advogado estava defendendo dois PMs da acusação de homicídios. Os clientes, aliás, eram os mesmos que foram absolvidos no ano passado.
O advogado foi punido com a pena de três anos de prestação de serviços comunitários e o pagamento de 20 salários mínimos por ter feito ofendido Cláudia durante o júri. Cabe recurso.
Promotora acusa advogado de comentários homofóbicos durante júri de policiais em SP
“Vai ser gay na Rússia pra ver o que acontece”, falou Vendramini.
O governo russo tem a política de proteger o que chama de “valores tradicionais” do país. A repressão aos LGBTQIA+ (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis, queer, intersexuais, assexuais e outros) começou há uma década.
Cláudia, que acusava os policiais de executarem os suspeitos, é casada com outra mulher e conhecida publicamente como ativista dos direitos da comunidade LGBTQIA+.
Justiça condena advogado a 3 anos de serviços e 20 salários mínimos por falas homofóbicas
Promotora acusa advogado de homofobia
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