Câncer no pâncreas reprograma neurônios para crescer mais rápido, aponta estudo

Uma nova pesquisa que investigou a presença de neurônios em tumores no pâncreas concluiu que esse tipo de câncer reprograma a atividade neuronal para acelerar seu crescimento. O dado, parte de um esforço para identificar como cânceres afetam o sistema nervoso humano, pode futuramente ser convertido em tratamento para combater a doença.

Publicado na revista Nature, o artigo aborda um campo ainda em expansão.

“Mais e mais grupos começam a estudar em detalhes a neurociência do câncer. No entanto, quando começamos, percebemos que quase nada se sabe”, afirma Vera Thiel, do Heidelberg Institute for Stem Cell Technology and Experimental Medicine (Instituto de Tecnologia de Células-Tronco e Medicina Experimental de Heidelberg, em livre tradução), na Alemanha, uma das autoras do estudo.

Um dos motivos de por que o campo ainda carece de pesquisas é a falta de tecnologia apropriada para esse tipo de estudo. As ramificações dos neurônios, como essas encontradas em tumores, são muito frágeis, o que faz com que a tarefa de manipulá-las para análise em laboratórios seja um desafio.

No caso do novo artigo, os pesquisadores desenvolveram uma metodologia de rastreamento chamada “Trace-n-seq”. Rastreamento celular não é uma coisa nova, mas os cientistas trabalharam com adaptações nessa tecnologia para identificar as estruturas nervosas no câncer e de onde elas se originam. A partir dessa identificação, foi possível dissecar, dissociar e classificar tais ramificações.

“Isso foi realmente uma questão de idas e vindas, idas e vindas, porque essas estruturas também são muito frágeis no momento em que você as retira”, conta Thiel.

A escolha pelo câncer de pâncreas envolveu esse aspecto desafiador. Isso porque todos os tipos de câncer contam com ramificações do sistema nervoso, mas o câncer de pâncreas normalmente tem uma maior quantidade. Desse modo, era mais fácil investigar o tema da pesquisa nesse tipo tumor.

Por meio da análise possibilitada pela “Trace-n-seq”, os pesquisadores então identificaram marcadores neuronais específicos no caso dos pâncreas cancerígenos. Eles eram associados com a reprogramação desses neurônios por parte do tumor, causando um crescimento mais rápido do câncer.

Na sequência os pesquisadores realizaram outros experimentos. O objetivo era entender se inibir a atividade desses neurônios resultaria em um menor ritmo do desenvolvimento do tumor, o que realmente ocorreu.

Não foi identificado com exatidão quanto a inibição da atividade neuronal reduziu o tamanho do tumor. No entanto, Thiel indica que, em média, o crescimento foi cerca de três vezes mais lento nos cânceres que tiveram as atividades neuronais suspensas. “Eles estavam crescendo mais devagar”, resume a autora do estudo.

Por essa descoberta, acredita-se que impedir o funcionamento desses neurônios presentes no ambiente cancerígeno pode ser um alvo terapêutico. Isso, no entanto, seria somente um complemento a tratamentos convencionais, como quimioterapia, já que “sempre precisaria de uma terapia adicional para atingir também essas células cancerígenas”, continua Thiel.

Mas outras pesquisas, que inclusive já estão em curso, precisam ser feitas para identificar melhor esse mecanismo nervoso do câncer. Além disso, no estudo realizado por Thiel e seus colegas, o bloqueio nas atividades neuronais associadas ao câncer foi feito no começo do tumor, o que não é algo que aconteceria na vida real. (Folhapress)

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