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Atentado foi um capítulo negativo na história do futebol brasileiro
(Reportagem de Anderson Malagutti e Pedro Maranhão)
Bairro do Curado, Zona Oeste do Recife, madrugada do dia 22 de fevereiro de 2024. Ali, em plena BR-232, próximo ao Atacado dos Presentes e a cerca de sete quilômetros da Arena de Pernambuco, onde há poucos minutos acabara de acontecer um jogo de futebol entre Sport e Fortaleza pela Copa do Nordeste, acontecia há exato um ano o atentado covarde de grupo de “torcedores” do clube pernambucano contra o ônibus com a delegação cearense.
Pedras, rojões e bombas caseiras foram arremessadas contra o veículo, que se deslocava para o hotel onde os jogadores do Laion passariam a noite antes de retornar à capital cearense. Atingidos por estilhaços dos vidros, seis atletas do Fortaleza acabaram feridos. E, muito mais do que feridas no corpo, um sentimento de insegurança e medo que deve levar anos para se apagar.
João Ricardo, Escobar, Lucas Sasha, Dudu, Titi e Brítez tiveram marcados na pele feridas de uma noite que manchou a história do futebol pernambucano, nordestino e brasileiro. Ganhou as páginas dos jornais do mundo e serviu de exemplo de como fatos como esse jamais deveriam acontecer.
Jogadores feridos no atentado
- João Ricardo
Escobar
Lucas Sasha
Dudu
Titi
Brítez
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Lateral Dudu foi um dos atingidos no ataque. Foto: Instagram/Marcelo Paz
365 dias depois do atentado…
Um ano após a fatídica noite, nem tudo está resolvido. Afinal, quantas pessoas foram responsabilizadas, presas e estão pagando pelo atentado covarde? Foi justamente essas respostas que o NE45 foi atrás.
Segundo apurou a reportagem, entre os dias 22 e 25 de abril a 2ª Vara do Tribunal de Júri da Comarca de Jaboatão dos Guararapes vai realizar a primeira audiência de instrução do processo. Durante a audiência de instrução, estão previstos os depoimentos de 29 testemunhas e dos réus.
No processo, há 11 réus:
- Pedro Henrique Duque de Lima
Luis Carlos Buarque Alves
Walter Mariano da Silva Neto
Lucas Rodrigo Ramos dos Santos
Jefferson Moura dos Santos
Carlos Renato da Silva
Thyago Mendes Barbosa
Gabriel Francisco Ferreira de Souza
Danilo Diogo dos Santos Soares
Israel Filipe Velez Alves de Amorim
Eduardo Santos da Silva
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Lateral Escobar também foi ferido no atentado ao ônibus do Fortaleza – Foto: Reprodução/Instagram/Marcelo Paz
Oito soltos, dois desaparecidos e um preso
Desses 11 réus, dois deles, Gabriel Francisco Ferreira de Souza e Danilo Diogo dos Santos Soares, ainda não foram encontrados e, por isso, tiveram a prisão preventiva decretada em decisão publicada no dia 24 janeiro de 2025. Até o momento, não houve o cumprimento dessas prisões pela polícia.
Também houve o decreto da prisão preventiva de Thyago Mendes Barbosa, por ele não ter seguido as medidas cautelares impostas anteriormente, sendo preso no episódio recente de brigas de torcida ocorrido no dia 1º de fevereiro, envolvendo as organizadas de Sport e Santa Cruz, pelas ruas do Recife, antes do Clássico pelo Estadual deste ano.
Os demais réus estão em liberdade provisória mediante o cumprimento de medidas cautelares. Veja abaixo quais são:
- Não se ausentarem da Região Metropolitana do Recife – RMR, por mais 15 (quinze) dias, sem prévia comunicação a esse juízo;
- Comparecimento bimestral em juízo, para atualizar o endereço para onde deverão ser dirigidas as futuras comunicações processuais;
- Afastamento imediato da Torcida Jovem do Leão, estando proibidos de comparecerem ao espaço físico destinado àquela organização, devendo manter distância mínima de 200 (duzentos) metros do Barracão, sede ou subsede, ou de se reunirem com os outros integrantes da agremiação denunciados, em qualquer espaço físico ou virtual, devendo, também, manter, um do outro, a mesma distância mínima obrigatória acima mencionada;
- Impossibilidade de participação nos grupos virtuais, inclusive do WhatsApp, criados e/ou utilizados pela Torcida Jovem do Leão, ou por integrantes desta associação, para debater assuntos específico da agremiação;
- Impossibilidade de comparecimento presencial aos jogos do Sport Club do Recife, seja ele realizado em qualquer Estado da Federação;
- Impossibilidade de contato, por qualquer meio, com as testemunhas destes autos, devendo manter distância mínima de 200 (duzentos) metros;
No documento, o MP ofereceu denúncia contra os réus por seis tentativas de homicídio qualificado e associação criminosa, entre outros crimes previstos no Código Penal (art. 121, § 2.º, I, III e IV, c/c art. 14, II do CP – por seis vezes -, na forma do art. 70 do CP, no art. 163, parágrafo único, II, e no art. 288, do CP, e no art. 201, § 1.º, II, da Lei n.º 14.597/2023).
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Atentado ao ônibus do Fortaleza – Foto: Divulgação
Declarações à época
“Jogaram uma bomba no nosso ônibus. Torcedores do Sport atingiram nossos jogadores. Dudu está aqui sangrando. Sasha está aqui sangrando. Isso é um absurdo, isso não cabe mais no futebol brasileiro. Estamos todos revoltados aqui”, disse Marcelo Paz, CEO da SAF do Fortaleza, em vídeo publicado nas redes sociais logo após o atentado.
Em transmissão à época, o atacante Thiago Galhardo, atualmente no Santa Cruz, reclamou do fato de não ser o primeiro atentado sofrido pelo time nesta temporada. Cobrando não só a segurança pública, mas também a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) por mais atitudes em casos como esse.
“Nem com polícia. Olha o tamanho da pedra. Parabéns, CBF, por essas m**** aí. Olha o pé do Yago [Pikachu]. Segundo jogo que jogam pedra em nós. CRB e agora. Esses filhos da p*** aí”, afirmou o atacante.
Em entrevista ao Globo Esporte, o presidente Rubro-negro Yuri Romão afirmou que, ao lado de Marcelo Paz, analisou as imagens e chegou a conclusão de que o ataque foi algo pensado. Afirmando que ninguém aguenta mais conviver com esse clima de terror antes, durante e depois das partidas.
“Por um vídeo que nós estávamos vendo, eu e Marcelo Paz (CEO do Fortaleza), notadamente a gente chega à conclusão de que foi algo pensado. O vídeo está nas mídias. Estamos numa luta, há mais de dois anos, para tentar mudar o futebol no Brasil”, iniciou.
“A gente não pode viver nesse clima de terror. A gente vai viver com uma delegação de 50 homens, 100 homens? Isso não é esporte, não é futebol”, completou o presidente do Leão.
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Janelas do ônibus do clube cearense após o atentado na BR-232 no Recife – Foto: Divulgação
Punição ao Sport
Após o atentado, o Leão da Ilha acabou sendo punido pela Segunda Comissão Disciplinar do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) a jogar oito partidas com portões fechados de competições organizadas pela CBF, como Copa do Nordeste, Copa do Brasil e Série B. A decisão aconteceu em março.
Porém, em abril, o Pleno do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) reduziu a punição de oito jogos de portões fechados para quatro partidas com público, mas sem a presença da organizada em questão envolvida no episódio. O clube também foi multado em R$ 80 mil.
O clube cumpriu a punição diante do Murici-AL (Copa do Brasil), Náutico e Juazeirense (Copa do Nordeste), e a última partida contra o Ceará, pela Copa do Nordeste. A decisão da Justiça deixou os torcedores do Fortaleza inconformados, esperando uma pena mais dura para o Sport por conta do atentado.
“Por maioria, o Pleno deu provimento ao recurso do Sport para fixar a pena a quatro partidas sem a torcida organizada, ou seja, com menos 25% da carga de ingressos”, concluiu o presidente do STJD, José Perdiz, em declaração à época.
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Dudu no desembarque do Laion após o atentado no Recife – Foto: Mateus Lotif / Fortaleza EC
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Marcas no rosto de Escobar após o atentado da torcida organizada do Sport – Foto: Mateus Lotif/Fortaleza EC