Juscelino Kubitschek e João Goulart: entenda por que as mortes desses ex-presidentes ainda são alvo de debates


Comissões e órgãos instalados após a redemocratização têm discutido essas mortes ocorridas na ditadura militar. Caso de JK, morto em uma batida de carro na Via Dutra, pode ser reaberto. A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, vinculada ao Ministério dos Direitos Humanos, informou na sexta-feira (14) que irá discutir com as famílias a possibilidade de reabertura da investigação sobre a morte do ex-presidente Juscelino Kubitschek. Após essas entrevistas, o grupo definirá se reabre as investigações.
JK morreu em 1976, após o carro em que ele estava na Via Dutra (que liga São Paulo ao Rio de Janeiro) colidir com um caminhão depois de ter sido tocado por um ônibus na altura do município de Resende (RJ) – leia detalhes mais abaixo.
Passados quase 50 anos da morte do ex-presidente, o episódio ainda gera debates.
Comissões e órgãos instalados após a redemocratização têm discutido essas mortes ocorridas na ditadura militar
Nos anos 1970, as ditaduras que governavam países da América do Sul, entre os quais Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile, firmaram uma parceria de serviços de inteligência para monitorar, sequestrar e até matar adversários políticos em ações clandestinas, que não deveriam ser divulgadas ou descobertas. A cooperação ficou conhecida como Operação Condor.
Estavam entre os alvos das ditaduras políticos exilados. Os aparelhos repressivos dos países tentavam neutralizar qualquer ação que pudesse causar movimentações políticas e sociais capazes de ameaçar a continuidade dos regimes.
JK morreu em 22 de agosto de 1976, e Jango, em 6 de dezembro do mesmo ano.
Veja detalhes dos casos:
Juscelino Kubitschek
Foto de perfil do ex-presidente Juscelino Kubitschek
Reprodução
Presidente que idealizou a mudança da capital do Brasil do Rio de Janeiro para Brasília, Juscelino Kubitschek teve os direitos políticos cassados em 1964, durante o regime militar (1964-1985). Na ocasião, dias antes de ser cassado, acusou a ditadura de agir com violência e atentar contra as instituições livres. Em 1966, no exílio em Lisboa (Portugal), participou das articulações de oposição ao regime militar.
Juscelino Kubitschek morreu em um acidente de carro em agosto de 1976, na Via Dutra, quando viajava de São Paulo para o Rio de Janeiro.
O acidente ocorreu na altura da cidade de Resende (RJ). O veículo em que Juscelino estava invadiu a pista contrária e colidiu com um caminhão, após ter sido atingido por um ônibus. O acidente resultou na morte do ex-presidente e de seu motorista.
Ao longo dos anos, diversas teorias sugeriram que o acidente poderia ter sido um atentado político, principalmente considerando o contexto da ditadura militar no Brasil.
Para a Comissão Nacional da Verdade, “não há nos documentos, laudos, depoimentos e fotografias analisados até o momento, qualquer elemento material que, sequer, sugira que o ex-presidente Juscelino Kubitschek e o motorista Geraldo Ribeiro tenham sido assassinados, vítimas de homicídio doloso.”
Vídeos em 3D recriam acidente de JK. Créditos: Ricardo Dachtelberg e Sergio Ejzenberg
A Comissão da Verdade em Minas Gerais, por outro lado, afirma: “Considerando o contexto da época, as distintas contradições das avaliações periciais, os depoimentos e pareceres jurídicos pode-se afirmar que é plausível, provável e possível que as mortes tenham ocorrido devido a atentado político.”
As duas comissões dizem ter se baseado em depoimentos, fotos e perícias da época para chegar as essas conclusões, distintas entre si.
João Goulart
João Goulart, o Jango, durante discurso como Presidente da República
Divulgação/Dossiê Jango
Presidente deposto pelo golpe militar de 1964, João Goulart teve os restos mortais exumados em novembro de 2013 para apurar a suspeita de ter sido morto por envenenamento em 1976, quando estava exilado na Argentina.
A exumação foi feita a pedido da Comissão Nacional da Verdade e o trabalho de perícia foi realizado pela Polícia Federal. O laudo apresentado teve resultado inconclusivo.
A análise dos restos mortais do ex-presidente não identificou sinais de envenenamento, no entanto, os peritos à época explicaram que a hipótese não poderia ser refutada. O intervalo de 37 anos entre a morte de Jango e a exumação poderiam ter prejudicado a conclusão do trabalho.
O ex-presidente morreu em 6 de dezembro de 1976, em Mercedes, província de Corrientes, na Argentina. A causa oficial foi infarto.
A família, contudo, alegava que o político, espionado pela ditadura brasileira, teria sido assassinado em uma ação da Operação Condor. A suspeita levantada era de envenenamento por cápsula colocada no frasco de medicamentos que Jango tomava para combater problemas no coração.
O ex-agente de polícia uruguaio Mário Ronald Neira Barreiro, à época preso em Porto Alegre, afirmou à Comissão Nacional da Verdade que Jango era monitorado no exílio em razão da articulação da Frente Ampla com JK e Lacerda, na década anterior.
A ditadura militar temia os efeitos políticos de um eventual retorno de Jango ao Brasil. O ex-presidente, no entanto, só retornou ao país morto para ser sepultado em São Borja, sua cidade natal.
Orlando Letelier
Chanceler do governo do presidente chileno Salvador Allende, Orlando Letelier foi assinado em um atentado a bomba em Washington em setembro de 1976. Allende morreu durante o golpe militar que levou o general Augusto Pinochet ao governo do Chile, três anos antes.
Segundo a Comissão Nacional da Verdade, a execução do ex-chanceler se deu no contexto da terceira fase da Operação Condor, considerada “a mais arrojada e secreta, ficou caracterizada por execuções”.
Letelier trabalhava nos EUA em um centro de pesquisas e fazia críticas contra Pinochet. Ele foi morto junto com sua colega de trabalho, a americana Ronni Moffitt, por um carro-bomba que explodiu na região central da capital dos Estados Unidos.
A repercussão do crime pressionou o governo americano pelo apoio que dava às ditaduras sul-americanas. Agentes da Dina, a polícia secreta do governo Pinochet, foram condenados pelo crime décadas mais tarde.
Em 2015, o então secretário de Estado dos EUA, John Kerry, entregou documentos a representantes chilenos que, segundo a família de Letelier, que comprovariam que Pinochet ordenou a morte do diplomata. O ex-presidente, que governou o Chile até 1990, morreu em 2006, aos 91 anos.
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