Larva de mosca usa “máscara” e se disfarça como cupim

O mimetismo é uma das formas de adaptação mais fascinantes do mundo natural: adaptações em que organismos ganham características de outras espécies, como os bichos-pau, o caso mais clássico. Já uma larva de mosca-varejeira, descoberta no Marrocos, se vale de artimanhas ainda mais curiosas.

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O inseto possui uma “máscara” na parte posterior do abdômen, e usa apêndices semelhantes a antenas, para se infiltrar em colônias de cupins, que não só não lhe fazem mal, como lhe dão “tratamento VIP”.

Esta não é a cabeça da larva; os "olhos" são espiráculos (Crédito: Roger Villa)

Esta não é a cabeça da larva; os “olhos” são espiráculos (Crédito: Roger Villa)

Larva espertinha é um cupim falso

O espécime, descrito em um artigo de pesquisadores do Instituto de Biologia Evolutiva do Conselho Superior de Investigações Científicas (CSIC), o maior instituto de pesquisas público da Espanha e o 3.º maior da Europa, faz parte do gênero Rhyncomya, moscas-varejeiras (família Calliphoridae) que ocorrem no Mediterrâneo e Mar Negro, do norte da África e península ibérica, até a Turquia e a Ucrânia.

O curioso, notado pelos cientistas, é que nenhum indivíduo do mesmo gênero, observado até o momento, possui tal comportamento. A larva descrita na pesquisa é considerada muito rara, foi encontrada em um completo golpe de sorte, com três indivíduos encontrados após levantar uma pedra em um cupinzeiro. Mais três expedições, e “centenas de pedras” movidas depois, apenas outras duas larvas foram encontradas.

A larva em questão foi encontrada na região do Anti-Atlas, em ninhos de cupins da espécie Anacanthotermes ochraceus, que vive em regiões desertas e semi-desertas do norte da África, Oriente Médio, e sudoeste asiático. Ela possui uma série de adaptações que a permite se infiltrar nas colônias, sem chamar a atenção dos soldados, o que seria mortal.

A mais óbvia é uma falsa cabeça, que a larva exibe na parte posterior do corpo. Embora não funcional, ela possui espiráculos (orifícios para respiração) que se passam por olhos, e a utilidade de tal apêndice não é lá tão questionável.

Cupins e formigas vivam no escuro, uma adaptação visual não influenciaria tanto, exceto pelas operárias que fazem coleta de folhas e outros recursos fora das colônias, estas contam com olhos funcionais.

A “máscara” é adornada com antenas e palpos também falsos, alguns dos vários apêndices em forma de tentáculos espalhados pelo corpo da larva, e estes, sim, possuem uma função.

Larva usa tentáculos e outros meios para enrolar os cupins (Crédito: Cell Press/Elsevier)

Larva usa tentáculos e outros meios para enrolar os cupins (Crédito: Cell Press/Elsevier)

Na colônia, cupins usam suas antenas e substâncias com odores específicos para se comunicarem, cada indivíduo possui um cheiro específico e identificável. Se algum inseto entrar no cupinzeiro, e não for reconhecido, será imediatamente marcado como intruso, e seviciado pelos soldados.

As larvas da Rhyncomya sp. contornam esse problema, sendo química e morfologicamente semelhantes a seus hospedeiros, ao ponto de se passarem perfeitamente como mais um cupim.

Elas também emitem odores muito semelhantes, para que o disfarce seja o mais perfeito possível; elas se instalam nas câmaras de suprimento, e curiosamente, foram observadas sendo “servidas” pelos membros da colônia, embora os cientistas não tenham identificado o que elas comem.

Segundo Roger Vila, um dos co-autores do estudo, as larvas usam os tentáculos para se comunicarem o tempo todo com os cupins, e estes dão preferência a atender os oportunistas, em um comportamento ainda não esclarecido: pode ser uma relação de parasitismo social, onde o invasor venha a se passar por um reprodutor secundário (colônias só têm uma rainha e um rei ativos por vez), ou mesmo de simbiose.

Vila acredita que, considerando que a observação da Rhyncomya sp. que se passa por um cupim foi bem rara, é possível que o espécime tenha evoluído para este comportamento há pouquíssimo tempo, já que seus parentes não fazem nada do tipo.

No mais, é um exemplo para melhor entender as relações interespécies, e a extensão do processo de especiação, que pode ter diversos fatores, como Charles Darwin observou nos tentilhões com bicos variados, e outras ocorrências por influência do progresso.

Referências bibliográficas

SCHÄR, S., TALAVERA, G., TAHERI, A. et al. Blow fly larvae socially integrate termite nests through morphological and chemical mimicry. Current Biology, 10 de fevereiro de 2025.

DOI: 10.1016/j.cub.2025.01.007

Fonte: Popular Science

Larva de mosca usa “máscara” e se disfarça como cupim

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