Ricardo Silva (PSD) determinou suspensão do contrato por 120 dias para avaliar interesse público de projeto avaliado em R$ 175 milhões assinado pelo antecessor. Desacordo na transição prejudica a população, analisa especialista em direito administrativo. Prefeitura suspende obra do novo prédio do governo de Ribeirão Preto, SP
Um dos principais pontos de discordância na recente sucessão de poder em Ribeirão Preto (SP), a construção da nova sede da Prefeitura acaba de ser suspensa por determinação do novo prefeito Ricardo Silva (PSD) depois que o antecessor Duarte Nogueira (PSDB) assinou a ordem de serviço com a empresa vencedora da licitação no término de seu mandato em meio a uma disputa judicial.
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Agora, a obra de R$ 175 milhões, discutida desde 2017 e desenhada para centralizar departamentos e otimizar processos em um único complexo no Jardim Independência, fica parada por 120 dias. Período em que o novo comando do Executivo vai avaliar se o novo centro administrativo deve ou não sair do papel.
Com o projeto cancelado ou reiniciado após esses quatro meses, esse desacordo na transição da Prefeitura já é prejudicial aos moradores, na avaliação do advogado especialista em direito administrativo Thiago Marrara. Caso a obra seja cancelada em definitivo, a Prefeitura terá que bancar com os custos que já foram assumidos pela empresa contratada.
“Todo tipo de contradição entre as gestões, o fato de uma gestão iniciar um projeto e outra gestão paralisar, isso é sempre nocivo para a população, é sempre nocivo para os recursos públicos, porque afinal a gente já começou algo, muito foi gasto com planejamento, e assim por diante e a gente tem que evitar na medida do possível”, diz.
A seguir, entenda os desdobramentos da suspensão do novo centro administrativo de Ribeirão Preto.
Obra do novo Centro Administrativo de Ribeirão Preto, no Jardim Independência
Cacá Trovó/EPTV
O prefeito pode suspender o contrato?
Sim. Mesmo com o contrato assinado e a ordem de serviço dada na gestão anterior, o novo prefeito tem a prerrogativa de fazer uma avaliação prévia para definir se quer ou não seguir com o projeto.
“Quando falamos de suspensão do contrato do centro administrativo estamos querendo dizer que o prefeito determinou a paralisação dessa obra para que faça uma avaliação sobre a necessidade dessa obra, sobre os recursos que estão sendo investidos nessa obra e se vale a pena prosseguir com esse contrato”, afirma Marrara.
Ainda assim, ele destaca que isso deve ser feito com cautela e desde que haja um risco de comprometer outras áreas mais prioritárias.
“A gente só deve tomar essas medidas drásticas de extinguir um contrato começado do passado a partir do momento em que exista efetivamente um interesse da sociedade ribeirãopretana em usar esses recursos para outras políticas, por exemplo, para políticas de saúde, habitação, para trânsito e assim por diante, mas não se deve extinguir esse contrato sem essa análise”, diz.
Segundo a procuradora-geral do município Thaísa Cintra Dosso, essa suspensão é uma forma de a administração se proteger de problemas deixados por gestões passadas.
“Sempre que tem o início de uma nova gestão ela precisa fazer uma reavaliação do interesse público em manter alguns contratos, algumas situações considerando tudo que já vem sendo feito”, afirma.
O que será avaliado no período de suspensão?
De acordo com Thaísa, diversos fatores serão avaliados nos próximos quatro meses antes da definição pelo cancelamento das obras. Entre eles:
disponibilidade no orçamento;
atual localização do centro administrativo;
atendimento ao público;
alegações da empresa contratada;
prioridades do município
“A nova gestão vai fazer uma avaliação se a construção de um novo centro administrativo é uma prioridade considerando outras prioridades que são afetas à nova gestão. É uma análise global considerando as prioridades, diversos fatores, não tem um ou outro, tem vários fatores que agora nesse momento criteriosamente analisados verificando se há realmente a permanência no interesse público na manutenção desse contrato”, explica.
Atual sede da Prefeitura de Ribeirão Preto desde a desocupação do Palácio Rio Branco
Reprodução/EPTV
Por que a nova gestão defende manter a Prefeitura no Centro?
A possibilidade de manter a Prefeitura no Centro da cidade também é uma das questões a serem levadas em conta nessa análise. Além de ser uma reivindicação de comerciantes, a medida já era defendida pelo novo prefeito durante a campanha eleitoral.
Embora esse seja só um dos aspectos a serem considerados, a procuradora-geral defende que a manutenção da sede do poder Executivo na região central é uma questão de identidade cultural dos moradores.
“A Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto sempre foi no Centro, a população conta com essa referência. Nós estávamos em um endereço, agora estamos em outro, então há uma questão de identidade cultural da população com o Centro. Isso também é um elemento, além de outros.”
O que acontece após o período de avaliação?
Caso a Prefeitura entenda que o projeto deve ser retomado, as obras recomeçam com a empresa contratada. Caso contrário, o contrato é cancelado definitivamente de maneira unilateral.
“Caso a Prefeitura entenda que não vale a pena prosseguir com esse contrato por motivos de interesse público, por exemplo, porque nós podemos pegar esse recurso e aplicar em política de educação, de saúde, e outras coisas que sejam mais prioritárias para a população, então o prefeito pode dar um segundo passo que é rescindir o contrato, ou seja, extinguir o contrato diretamente e independentemente da vontade da empresa contratada”, afirma Marrara.
Essa medida, no entanto, implica consequências administrativas para o poder público. Segundo a procuradora-geral, embora não haja punições, a Prefeitura deverá arcar com todos os gastos que a empresa teve desde que iniciou as obras.
A suspensão de 120 dias, inclusive, foi uma forma de amenizar os gastos municipais a serem assumidos futuramente assumidos com a rescisão.
“Se nós mantivéssemos o contrato até a decisão, esse prejuízo, esse montante ia aumentando. Suspendendo agora, o valor eventualmente a ser ressarcido para a empresa evidentemente vai ser menor.”
Projeto do Centro Administrativo Municipal de Ribeirão Preto
Arte/Prefeitura de Ribeirão Preto
Quanto a Prefeitura deverá pagar se rescindir o contrato?
Segundo Thaísa, os gastos com a possível rescisão contratual ainda não foram calculados.
“A partir de agora a administração vai levantar todos os motivos que eventualmente podem levar a uma decisão de rescisão, inclusive permitindo a empresa que se manifeste no processo, que traga suas alegações. Em havendo uma decisão, a empresa vai poder trazer todos os prejuízos devidamente comprovados e será feita uma apuração desse valor.”
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Esses gastos podem incluir tudo aquilo que foi realizado pela empresa para o planejamento das obras, desde contratação de funcionários a compra de materiais e equipamentos. Caso contrário, o município pode responder judicialmente.
“Tudo aquilo que a empresa executou deve ser pago, o poder público não pode deixar de pagar a empresa por aquilo que foi feito, por aquilo que foi construído efetivamente e pode ser também que a empresa já tenha adquirido material para as próximas fases, pode ser que ela tenha adquirido maquinário, e nesse caso, mesmo que ela não tenha executado essas próximas fases, tudo isso que ela despendeu para planejar o futuro do contrato tem que ser também ressarcido.”
Onde o dinheiro do projeto pode ser aplicado?
Com uma dotação orçamentária específica para a execução do projeto, os R$ 175 milhões poderão ser remanejados para outros projetos do município.
“O município tem diversas prioridades, temos problemas na educação, na saúde e esse dinheiro pode perfeitamente ser alocado para essas outras prioridades. Não posso dizer quais porque são muitas, mas elas com certeza existem”, afirma a procuradora-geral.
Esse remanejamento, no entanto, precisa ser justificado pela Prefeitura. “É claro que a Prefeitura tem que respeitar algumas regras de planejamento orçamentário, mas respeitando essas regras ela pode realocar esses recursos para outros contratos ou outras áreas, isso é perfeitamente possível”, explica o especialista em direito administrativo.
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